E eu aproximei-me, agachando-me perto daquela sombra de rosto desconhecido… e aí, uma mão esquelética, com a pele sumida e enrugada, com os dedos esguios e pontiagudos agarrou-me no queixo para finalmente me olhar de frente.
A partir daí tudo foi muito repentino… lembro-me de ver um olhar vermelho a furar os meus pensamentos e aí, dominando todo o meu consciente, milhões de flashes percorreram os canais do meu cérebro. Sim! Era como se estivesse a tirar fotografias a lugares e pessoas que nunca tinha visto. Lembro-me de ter visto um homem, de cabelo loiro a olhar para mim. Lembro-me de ver uma floresta mais negra que aquela mesma noite, ver uma estátua mais pálida que o luar e um vulto mais assustador que a própria sombra que me agarrara a face. Ainda me recordo, que depois disso, ter visto milhares de paisagens, de ver água à minha volta com bolhas a flutuar e ter a sensação que me afogava. Vi ainda fogo, muito fogo a arder e a queimar-me a pele e por fim, vi gotas de sangue a cair num charco dele. Eram milhões de flashes que percorriam a minha mente, dando-me sensações terrivelmente aterradoras. Por dentro sentia-me mal, enjoada, quase a vomitar, quando aquela mão desguarnecida me soltou o rosto. O seu voltou a esconder-se na sombra e apenas a sua voz, somente a sua voz era capaz de me fazer estremecer e acalmar ao mesmo tempo. Sim! Nunca me sentira assim aterrorizada, nunca sentira o meu coração bater daquela maneira, as minhas veias deixarem fluir o sangue como um rio num dia de temporal. Mas não era por isso que a noite deixara de ser calma, tornando o ambiente ainda mais tormentoso. A coruja continuava a ulular no seu ritmo normal e soturno, a raposa continuou a devorar a galinha que deixara de estremecer, o vento continuou a sua ausência e as estrelas teimavam em se manterem escondidas e eu, ali parada, sem qualquer reacção, apenas deixando o meu corpo se sentir cada vez mais pesado, quase a cair.
